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PLURAL: os textos de Márcio Bernardes e Rony Cavalli

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Eu sou apenas um rapaz latino-americano
Márcio de Souza Bernardes
Advogado e professor universitário

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No dia 26 de outubro, Antônio Carlos Belchior, um dos grandes poetas da música popular brasileira, faria aniversário. O título deste texto é para lembrar dele. Mas não só isso. O título deste texto também faz referência ao dia 25 de outubro deste ano, no Chile, ao dia 18 de outubro, na Bolívia, ao dia 27 de outubro de 2019, na Argentina. Sim, este texto fala da nuestra américa que, apesar de invadida, saqueada, explorada desde de 1492 por Europeus, e depois pelos Estados Unidos, insiste em resistir, se reinventar e buscar seu lugar no mundo. E, pelo jeito, vai continuar assim enquanto existir por aqui, nestas veias abertas, nosso sangue latino.

DIREITOS DE PACHAMAMA

Entre a segunda metade da década de 1990 e a primeira década dos anos 2000, a América Latina foi palco de muitos movimentos sociais e políticos que desaguaram no que é chamado hoje de novo constitucionalismo latino-americano. Este constitucionalismo buscou refundar o Estado na Bolívia (nas palavras de Boaventura Sousa Santos), que passou a reconhecer-se não mais como um Estado Nacional (de uma única nação), mas um Estado Plurinacional, afirmando a pluralidade de culturas, de visões de mundo como formadora daquele povo. Assim foi também no Equador que, além de tudo isso, teve a primeira Constituição no mundo moderno a reconhecer expressamente a Natureza como um sujeito de direito (direitos de Pacha mama), a partir da forte inspiração na cosmovisão dos povos indígenas que tiveram protagonismo em todo o processo constituinte. Além disso, estas constituições buscam ampliar as participações democráticas e as proteções de direitos sociais e ambientais.

MELHOR QUE UM BLUES

No dia 25 de outubro, o povo chileno, através de um plebiscito, resolveu enterrar de vez o passado ditatorial de Augusto Pinochet e sepultar junto a Constituição de 1980, que deu as bases para as políticas neoliberais que aumentaram a desigualdade e a pobreza naquele país. Como resultado dos levantes de outubro do ano passado, a imensa maioria decidiu por uma nova carta constitucional, a ser escrita por uma Assembleia Constituinte exclusiva, com paridade de gênero (50% mulheres e 50% homens), e com cotas reservadas para participações de povos indígenas. Ao que parece, o Chile seguirá nos passos do novo constitucionalismo da América Latina.

Que estes bons ventos da resistência ao neoliberalismo e ao neofascismo continuem a soprar e cheguem por aqui. Porque a história segue e, lembrando Belchior, a palo seco, eu sigo com meus anos "de sonho, de sangue, e de América do Sul" e "por conta deste destino um tango argentino me cai bem melhor que um blues".

Democracia em excesso
Rony Pillar Cavalli
Advogado e professor universitário

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Com o início das campanhas eleitorais, mais uma vez confirma-se o que faz muito tempo que repito. Há democracia demais, há permissibilidade demais nas alternativas que nos apresentam a escolher, especialmente as alternativas ao parlamento municipal. Não, eu não sou antidemocrático ao dizer que há democracia demais. Explico.

Quando promulgada a atual constituição, foi uma festa da democracia, afinal ela consolidou o modelo democrático e a comemoração não era sem motivo, afinal, com ela, apagava-se de vez as luzes de um "estado de exceção" e inaugurava-se um modelo de um Estado em que o poder definitivamente estaria em sua base e não mais centralizado em mãos de generais. Por outro lado, tenho certeza que muitos já ouviram também que "a constituição deu muitos direitos e poucos deveres". É aqui que entendo que a democracia está em demasia, pelo menos até o eleitor efetivamente ser preparado para as escolhas eleitorais.

PLENA CIDADANIA?

O Constituinte tinha expectativa que o novo Estado que nasceria investiria massivamente em educação e que a qualificação de todos prepararia qualquer cidadão para exercer qualquer cargo, então, nada mais democrático do que permitir qualquer cidadão ser candidato a qualquer cargo. Todos conhecem o conceito de plena cidadania que é a "capacidade de votar e de ser votado". O Constituinte foi de um romantismo invejável, pois o investimento em educação não veio e o resultado disto é o que vemos nos apresentar hoje nestas eleições. Em Santa Maria, para citarmos apenas um, temos candidato que é conhecido explorador de prostituição feminina, mas permiti-lo como candidato é democrático.

Não é de hoje que defendo que enquanto o tão sonhado investimento em educação não vem, faz-se necessário que sejam exigidos mais requisitos de qualificação para candidatos a cargos eletivos. Já foi eleito à Presidência da República um semianalfabeto que se vangloria em sê-lo. Se não for estabelecido requisitos de qualificação, não é de se duvidar que o "Tiririca" seja candidato à Presidência e se duvida menos ainda da possibilidade do povo votar nele.

Também costumo fazer um comparativo que retrata bem nossos políticos. As eleições se parecem com concursos de beleza. As mais belas e elegantes não participam dos concursos, assim como os mais preparados dificilmente colocam seus nomes na política, preferindo não se envolver com o público e ficar na iniciativa privada.

É triste, mas é fato que o requisito mais festejado da democracia é a popularidade e não a qualificação do candidato.


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